[TD/FB] A próxima geração

Com a lanterna na mão, vagava, perdido, observando os cantos dos corredores escuros, cuja luz dançante das chamas não era capaz de alcançar. A destra guiava o caminho pela escuridão, levando luz para onde os pés pisavam e os olhos apontavam, sempre com cautela extrema para que não fossemos apanhados. Entre tanta tensão, um toque gentil me acompanhava sempre, uma mão macia e quente segurava a minha, permitindo que não nos separássemos, não importa o quão perigoso a situação se tornasse.

Tá tudo bem, Naoko-chan?

Perguntava a ela, parando um momento para colocar a lamparina no solo e afagar seus longos cabelos negros, confortando-a e buscando acalmá-la. Era difícil fazer algo divertido naquele lugar, com tantas regras, cobrança e costumes, o único horário ao qual seria capaz de mostrar à ela, algo especial, seria naquele.

Pisava calmamente no chão frio, sem pressa, mantendo o ritmo mais lento do que o ritmo de meu coração, que batia em selvageria voraz, sabendo das consequências que nos aguardavam caso fôssemos vistos. Tendo cruzado todo o pátio, conseguimos chegar até o enorme jardim florido, um campo repleto dos mais variados tipos de flor, assim como pequenos insetinhos ou alguns animais, como corujas.

Não me impressionando, uma coruja nos recebeu com um crocitar abafado, como se a idade já não lhe fosse tão indiferente. Me aproximei do banco de mármore, ajudando a garota mais nova a subir primeiro, pulando para cima em seguida. Onde deveríamos nos sentar, permaneciam os pés, enquanto o traseiro se acostou sobre o encosto para as costas, permitindo que tivesse uma visão privilegiada por de cima das grandes árvores.

Olha lá, vai começar!

E como uma técnica estranha ou uma ilusão bem trabalhada, a luz começou a mudar sua coloração, tornando-se vermelha por inteiro. A lua cheia, que nos agraciou com sua presença, havia vestido-se com sangue.

Resumo:

O que podia se esperar para a noite de uma garotinha de oito anos? Certamente deveria estar na cama, aconchegada entre seu cobertor e o pequeno travesseiro na beliche de madeira no quarto escuro do orfanato, porém não fora isso que aconteceu. Naoko estava mais desperta que em qualquer outro dia, afinal de contas, aquela noite seria um tanto especial para a mesma já que Ryo havia lhe prometido mostrar algo que a garotinha nunca havia visto em sua até então breve vida.

A morena estava sentada em sua cama balançando os pezinhos que ainda não alcançavam o chão. Seus olhos se mantinham abertos tentando fazendo com que a visão ficasse aguçada e a mesma pudesse enxergar alguma coisa o escuro evitando assim que se chocasse contra as outras camas e acordasse alguém. —Será que vai demorar?

Ela se perdia em seus pensamentos enquanto tentava controlar a ansiedade até que enfim o momento havia chegado. Duas batidas rápidas na porta havia sido o sinal combinado entre ambos. Com um sorrisinho estampado nos lábios, a menina se ergueu em um salto silencioso. Sem muita demora, cruzou o cômodo nas pontas dos pés evitando fazer qualquer barulho que pudesse acordar os outros ali presente.
Quando enfim conseguira passar pela porta, dera de cara com Ryo que, como prometido, estava preparado. A criança lançou um sorrisinho animado para o outro enquanto se preocupava em se juntar a ele.

As duas crianças seguiram caminho juntas. Naoko não se permitia soltar o outro por um minuto sequer, afinal de contas, não era esperto ficar perambulando no escuro pelo orfanato e seria um tanto pior caso se separassem e por obra do destino acabasse se perdendo em meio a escuridão. Um suspiro escapou pelos lábios da menina que dera de ombros quando enfim uma pergunta fora direcionada a si.

— Estou ansiosa…— Ela sussurrou com medo de ser escutada por mais alguém além de Ryotaro.

O menino dera de ombros e acalmou a pequena criança afagando seus cabelos por alguns instantes. Por um momento a criança enfim conseguira controlar seus sentimentos e prosseguira  no caminho com o outro jardim adentro.
Em poucos minutos ambos já se encontrava no espaço aberto apreciando a bela noite que fazia. Naoko enfim se erguera no banco ficando de pé no móvel por alguns minutos erguendo os olhos para a lua. Era realmente um espetáculo e tanto.

— Ryo-kun! É realmente linda…— Ela erguera os braços levando uma das mãos de em direção a lua como se fizesse menção a toca-la. ←Como ela muda de cor?

Adendos:

Ter uma companhia como ela, como aquela garota ao meu lado, acalmava meu coração de uma forma inexplicável. Quase como se houvesse um vínculo entre nós, algo invisível, um fio que prendia nossos destinos. Encará-la a sorrir, vendo a lua, fez a batida de meu coração quase cessar, já não me preocupando mais em ser apanhado ou de me meter em encrencas, já que aquele simples momento já havia valido a pena.

Assim como todas as crianças dali, minha relação com a pequena Naoko não era muito diferente, agíamos todos como irmãos, crescendo juntos, ajudando uns aos outros e dividindo experiências. Mas apesar do vínculo forte com todos, algo mais profundo parecia nos conectar, causando sentimentos perturbados em meu âmago.

Tenho certeza de que ela não é tão bela quanto você.

Brinquei, elogiando a beleza da garota ao meu lado, que todos do orfanato faziam questão de sempre exaltar, chamando-a dos mais diversos jeitos, sempre colocando-a sobre um pedestal. Percebi a ingenuidade infantil provinda das palavras da morena, sua pergunta era a mesma que já havia feito à Inobura, que foi quem me informou a respeito desse fenômeno raro.

Segundo o diretor, isso acontece porque há muito e muito tempo atrás, a lua desceu dos céus para conhecer um homem, aquele que havia ganho seu coração.

Gesticulava de forma meio abstrata, apenas para entretê-la mais profundamente durante a história.

Esse homem era um grande guerreiro, que acabou por findar em guerra. Então, de tempos em tempos, a lua chora lágrimas de sangue, por se lembrar de seu falecido amado. Deve ser triste mesmo, perder aqueles que amamos, deixá-los para trás sem nos despedirmos adequadamente.

Com uma expressão triste, mas ainda forçando um sorriso, agarrei a mão direita da garota com a minha esquerda, segurando-a firmemente. Com um olhar caído, mas ainda esperançoso, a encarei nos olhos.

Eu espero que não nos separemos nunca.

Resumo:

A pequena Naoko se mantinha completamente encantada com o luar. Para a criança era um evento fantástico, afinal de contas, nunca havia presenciado uma mudança como aquela e sua mentalidade ainda infantil apenas conseguia imaginar histórias fantásticas por trás de algo como aquilo. Os olhos estavam fixados enquanto ela tentava se esticar no banco cada vez mais. Em seu coração desejava deter poderes que fizessem com que realmente pudesse tocar o astro.

Um suspiro escapou pelos lábios rosados assim como uma sutil risada abafada quando o elogio partira de Ryo. Era incontestável que a menina fosse realmente dona de uma beleza imensurável, porém, crescera repleta de modéstia e aprendera a não se exaltar, mas todavia não recusava os elogios que ganhava… Pelo menos não até aquele momento. — Oh Ryo-kun, a lua é muito muito mais bonita, olha só pra ela!

E mais uma vez ela voltara os olhos brilhantes para o luar. Ficara presa naquela visão por mais alguns instante até que enfim se sentara no banco recolhendo as pernas para junto do restante do corpo, com isso ficando ainda menor, porém aquecida.
Naoko se remexera no banco até ficar diante do garot que lhe contava a história da lua de sangue. Como a própria imaginava, era uma história um tanto interessante comovente o suficiente para fazer com que lhe fosse arrancando mais um suspiro e uma careta em sinal de desaprovação.— As pessoas que amamos sempre morrem… Isso deveria ser proibido! Tadinha da lua, ficou sozinha pra sempre…

O tom de voz da menina era um tanto melancólico sendo quase palpável aos que presenciaram a cena. Sem demora ela voltou a se erguer novamente no banco exatamente no momento que tivera a destra agradada pelo amigo. Naquele momento, Naoko sentira seu coração aquecido novamente. — Mas é claro que não iremos Ryo-kun, você é o onii-chan que eu nunca tive.

As palavras da criança eram as mais sinceras que um dia já vieram a ser. Seus olhos se mantinham no garoto por um tempo enquanto o sorriso se estava no seu rosto, mas não por muito tempo. Subitamente a expressão da menina mudara e vira a se transformar em algo que simbolizada estar um tanto chateada. — Deveria ser meu onii-chan.

De fato indignava, a menina saltara do banco tentando se equilibrar.

Adendos:

Podia perceber a admiração que a pequena garota ao meu lado tinha para com a lua. Não havia como culpá-la, era realmente um espetáculo, aquele enorme astro avermelhado, trazendo consigo uma luz carmesim por onde quer que pudesse ver, carregando um pouco da tristeza embora, pelo que podia sentir. Fui capaz de ver algo que não deveria, como se a lua tomasse a forma de uma enorme espiral, um símbolo que já havia visto antes, mas não seria capaz de me lembrar ao que se referia, não antes que ela voltasse ao seu estado normal e eu percebesse que havia sido apenas uma ilusão, ou talvez, uma memória.

Naoko estava indignada, talvez a história que deveria lhe trazer reflexões, havia apenas lhe enchido de descontentamento. Diante do descontentamento, das caretas e da clara melancolia que ela exalava, não pude evitar de passar a mão sobre sua cabeleira, afagando-a em uma tentativa de trazer conforto.

Então está decidido, ficaremos para sempre juntos, Naoko.

Pensei que a felicidade retornaria para a garota, mas seu sorriso não durou muito, sendo substituído por uma outra careta de decepção ou tristeza. De seus finos lábios, uma reclamação, que eu faria questão de responder da melhor forma possível.

Se é o que você deseja, então é o que eu serei.

Já era recorrente ver adultos virem adotar as crianças do orfanato como se fossem seus próprios filhos. Se um adulto tinha liberdade para tomar uma criança para si, chamando-a de “filho”, não teria problema algum em nos tornarmos irmãos, era o que imaginava. Um sorriso largo fora entregue à Naoko, selando o acordo com a honestidade que apenas eu seria capaz de lhe entregar naquele momento. Sob a luz vermelha da lua sangrenta, pensei que seria melhor que retornássemos para nossos quartos, antes que fossemos pegos por alguém, fazendo o que não poderíamos estar fazendo.

Resumo: