[Treinos] Zuko Akuma

Depois de minha primeira missão, algo ficou claro pra mim: eu precisava sim superar minhas limitações em relação ao Ninjutsu e ao Genjutsu, mas precisava também valorizar aquilo em que era bom. E por isso havia decidido me dedicar a um tempo de treino da minha habilidade em Taijutsu e na minha resistência física. Vovó dizia que eu pegava pesado demais comigo mesmo, mas eu não concordava. Já tinha 14 anos e ainda era um Genin mediano. Queria mudar isso o mais rápido o possível. Por isso, acordei bem cedo, arrumei minha mochila e parti para o campo de treinamento de Konohagakure no Sato.

O dia estava ensolarado e, apesar de ser inverno, o clima estava agradável. Não frio demais como o de costume. Meu caminho até o campo fora muito tranquilo. Vários pássaros voavam pela manhã e cantavam em uníssono, quase como uma sinfonia. Poucas pessoas já estavam de pé. A maioria idosos ou servidores do vilarejo. Ainda assim, a vida urbana já começava a borbulhar. Barracas de comida começavam a picar os ingredientes para que estivessem preparados na hora de servir os clientes, filas de crianças eram vistas a caminho da academia e até mesmo agentes da ANBU podiam ser percebidos para quem parasse para observar. Konoha era uma vila diurna em essência. Pelo menos a parte socialmente aceita.

Assim como as ruas, o campo de treinamento não estava nem abarrotado e nem abandonado. Poucas pessoas sem alma como eu tinha coragem de levantar tão cedo para treinar. Os fracassados e a escória em sua maioria. Aqueles que precisavam se esforçar muito mais para conseguirem atingir o mínimo necessário. Mas eu não queria permanecer nessa mesma situação. Contanto que não permanecesse imóvel. Meu objetivo era sempre o de melhorar, mas nunca o de ser melhor que ninguém. Talvez melhor que minha mãe que há anos havia matado o meu pai e tentado matar a mim também. Mas eu ainda estava muito longe de atingir o seu nível. A mulher que me criara podia ser intolerante com minha habilidade sanguínea, mas era uma das shinobi mais formidáveis que eu já havia tido a chance de presenciar.

Na maior parte do tempo eu até me esquecia que eu na verdade era nós. Osai e Azulon, os dois filhos que quase foram mortos. Nossa conexão e simbiose era tão grande que até pensávamos juntos. Não havia um "nós", só havia um "eu". Zuko, uma supra-identidade. Para além de Osai e Azulon, mas só possível através deles. Ainda não entendia porque isso causava tanto desconforto em minha mãe. Mesmo sabendo que alguém com a mesma linhagem sanguínea havia sido responsável pela morte de seus pais. Mas era por isso também que eu precisava treinar. Kiri e Konoha não eram vilarejos necessariamente aliados e um conflito entre os dois poderia ser eminente. Então precisava me fortalecer porque caso minha mãe me encontrasse num campo de batalha, ela não hesitaria em me matar.

O campo de treinamento era muito cômodo. Especialmente para o treino de Taijutsu. O lugar era cheio de bonecos de madeira dispostos em fileiras largas e espaçosas. Ainda que você estivesse fracassando na luta contra um ser inanimado, provavelmente ninguém notaria, já que a distância entre eles era considerável. Larguei minha mochila no chão de areia ainda um pouco úmido do sereno da noite anterior e comecei a bater no boneco. Ainda que eu fosse habilidoso em Taijutsu, sabia que havia espaço para a melhora. Um dos meus senseis durante o tempo de academia sempre dizia que era melhor ser excepcional em uma arte do que medíocre em todas. E por isso eu estava apostando nas minhas habilidades corporais.  

Continuei a socar e a chutar o boneco por um bom tempo. Ainda que um parceiro de treinamento pudesse ser mais efetivo, o "madeirão" (como eu gostava de chamar os bonecos) dava pro gasto. Mesmo que eu tivesse uma aptidão natural para o combate corpo-a-corpo, eu sentia que meu conhecimento de movimentos ainda era muito limitado. Eu era um bom lutador, mas um bom lutador sem técnica. Na maior parte das vezes em que tentava inovar, acabava criando um movimento ridículo e sem pé nem cabeça. Os socos se cruzavam, os chutes acabavam em tombos e os esquives em deslizes. Eu sabia que pra realmente progredir no Taijutsu, precisaria de muita técnica. Mas pra conseguir alguém que me ensinasse a técnica ainda faltava um pouco. Ou talvez ainda faltasse muito. E por isso eu não me cansava de socar e chutar um simples boneco de madeira.

Conforme o dia avançava, mais pessoas chegavam ao campo de treinamento. Alguns deles acompanhados, mas a maioria sozinhos. Parei por um segundo para descansar, mas também para praticar a arte da observação. Vovó dizia que era fundamental que todo ninja fosse um bom observador. A maioria parecia estar ali treinando habilidades ligadas ao Taijutsu. Alguns corriam, na tentativa de melhorar sua agilidade, outros levantavam pesos buscando aumentar a força e outros faziam como eu. Socavam e chutavam. Ao observar tantas pessoas, acredito que possa ter até melhorado a minha própria habilidade de luta. Conseguia, ao analisar de longe, perceber erros comuns nos movimentos. Erros que até mesmo eu cometia e que agora tinha mais pistas sobre como deixar de cometer.

Depois de mais algumas rodadas de combate contra o "madeirão", decidi que treinaria também a minha resistência física, que por acaso não era das melhores. Ainda que eu pudesse lutar bem, sentia que minha resistência ao cansaço era extremamente limitada e por isso precisava treinar. Tentei exercícios como abdominais, fazendo repetições até a falha e sempre tentando superar o meu recorde na próxima tentativa. O mesmo com flexões de braço e com agachamentos.

Após algum tempo nesse treino, comecei a sentir meus músculos enrijecidos e já um pouco doloridos. Não queria nem sequer imaginar a dor que sentiria no dia seguinte. Ainda assim, queria fazer mais uma série de exercícios focada em resistência antes de ir embora. Depois de matutar um pouco pensei na estratégia perfeita. Pulei para o galho de uma árvore e fiquei me segurando, até não aguentar mais. E quando não aguentava, soltava, descansava um pouco e repetia o processo. Sentia que até o "madeirão" estava me julgando pela minha resistência tão baixa. Mas com algumas tentativas percebi uma leve melhora. Já havia treinado o suficiente.

No caminho de volta pra casa, encontrei as coisas quase como na vinda. Com poucas pessoas na rua, mas ainda com muita atividade. Mas dessa vez, as barracas estavam lavando tudo e se preparando pra fechar, as crianças voltando da escola e os ANBU ainda nas sombras.

Mesmo que eu estivesse me saindo bem em minhas missões, sentia que ainda faltava tanto para me tornar um shinobi formidável. Eu me via feliz com o caminho que estava tomando, me tornando um forte combatente. Mas ainda que eu tivesse habilidade suficiente em taijutsu para utilizar algumas  técnicas avançadas, sentia que a minha resistência ainda era muito aquém para um combate sério. Por isso precisava treinar muito mais e aprender a gerenciar minha firmeza. Em vários sentidos, sentia que não era apenas a minha resistência física que ainda era frágil, mas também a mental. Precisava fortalecer meu corpo e minha mente.

Eu tentava pensar em figuras resilientes como inspiração. O Nindaime Hogake era uma das figuras mais imponentes que conhecia. Não era exatamente um homem popular. Mas era firme em suas decisões e tão poderoso que eu me sentia intimidado só de passar perto de seu gabinete. Minha mãe também era uma shinobi resistente. Era uma mulher muito digna e forte, ainda que nutrisse um ódio mortal por mim, devido a minha linhagem sanguínea. Uma terceira fonte de inspiração era minha avó, uma mulher idosa, mas ainda assim uma fortaleza física e moral. A velha conseguia aguentar provocações como se não fossem nada.

Eu era diferente deles em muitos sentidos. Não era um poço de poder como o Hogake. Na verdade muito pelo contrário. Ainda era um ninja novato e pouco habilidoso. Não tinha a disciplina e a determinação de minha mãe. Preferia a flexibilidade do que a rotina. E definitivamente não era calmo como minha avó. Me deixar de cabeça quente era fácil. Um defeito que eu lutava contra há anos, mas que ainda me assombrava. Ainda precisaria de muito tempo para atingir qualquer patamar que eles tenham alcançado. Mas sabia que precisaria começar pequeno e o mais rápido possível.

Eu queria melhorar meu desempenho físico e mental e pra isso havia preparado algumas atividades. Sabia que passaria na biblioteca, como primeiro ponto de treino, mas antes queria comer alguma coisa. A vila já estava em atividade total. As ruas cheias, e movimentadas mostravam o porque eu adorava Konoha. Ainda que Kiri também fosse um grande centro, a vida urbana lá era muito diferente. Ao menos era assim que eu me lembrava do meu tempo de criança. Todos os vizinhos fofoqueiros faziam com que me sentisse preso. Em Konoha, ninguém tinha tempo para se preocupar com a vida alheia. Todos eram muito ocupados.

Parei em uma pequena barraca de lámen e pedi uma porção. Não só a aparência do prato era incrível, como seu aroma era delicioso. Peguei me perguntando enquanto saboreava o prato se havia lições de resiliência em uma porção de lámen. Talvez uma pérola de sabedoria pudesse me ajudar no meu objetivo.


- Senhor. - Falei chamando o cozinheiro.

- Pois não, garoto. - Respondeu ele se virando para mim. - Quer mais uma porção?

- Não, ainda estou comendo. - Disse o interrompendo. - Queria saber se você tem algum conselho pra me dar, sobre como ser mais resiliente.

- Você me interrompeu pra isso? - Peguntou ele, com uma cara de enfurecido. - Eu sou um cozinheiro, não um sensei.

- Seu velho amargurado! - Gritei jogando o dinheiro pelo balcão e saindo.


Escutei o homem resmungando enquanto eu saía, mas decidi não dar atenção. Mais uma vez eu não estava me comportando da forma como esperava e sim como um estressadinho e cabeça quente. Não queria me estressar mais uma vez, então decidi ir direto para a biblioteca da cidade. Eu não sabia exatamente o que leria, mas tinha certeza que haveriam livros sobre calma e resiliência em combate. Assim que entrei, encontrei os corredores abarrotados de estudantes da academia. Não parecia mesmo que esse seria meu dia para ficar calmo.

Subi para o segundo andar e comecei a minha busca por algum material que pudesse ser útil para o meu treinamento. Encontrei um livro interessante que fala do controle da mente de forma análoga ao controle de chakra. Nas primeiras páginas sentia que não estava entendendo nada, mas conforme ia me aprofundando na leitura, os conceitos pareciam fazer mais sentido. O livro tinha sido especificamente para ninjas e achei a abordagem muito interessante. Ele tratava a raiva, o medo e a frustração como fluxos de energia, que podiam ser redirecionados para zonas específicas do corpo ao invés da cabeça.

Por quase duas horas me compenetrei na leitura e me mantive completamente focado. Eu sentia até mesmo que as informações do livro estavam entrando diretamente no meu sistema nervoso, e que eu conseguiria controlar resistir mentalmente a qualquer emoção. Contudo, com o passar do tempo, alunos da academia começaram a correr pela biblioteca, rindo e quebrando o silêncio. Em poucos minutos, já não conseguia mais me concentrar no livro e a sensação de inquietação logo se transformou em fúria.


- Já chega! - Gritei me levantando. - Eu vou focar é na minha resistência física.

- Shhhh. - Sinalizou a bibliotecária apontando para uma placa que pedia silêncio.

- Você só pode estar brincando comigo. - Falei bufando.


Já era quase pôr-do-sol e, ainda que eu tivesse entendido as ideias e conceitos do livro, sentia que minha personalidade estressada sempre seria um desafio e me tornaria um ninja menos resistente. Por isso me convenci que precisava dominar meu corpo, já que era a parte de mim que tinha mais controle sobre. Lembrava de minha avó me contando que em seus dias como shinobi, seu sensei fazia com que ela e sua equipe mergulhassem num lago gelado ao norte de Konoha e tentassem o seu máximo para aguentar a temperatura pela maior quantidade de tempo possível.

Fui andando até o lago e o vento da noite já parecia congelante. Era inverno e a água do lago estava tão gelada que me lembrava de Kiri. Ainda que parecesse uma tarefa estranha, eu estava determinado. Tirei todas as minhas roupas e entrei no lago. A água congelante me fez tremer todos os meus músculos. Parecia impossível, mas tentei me manter firme no propósito de ficar ali por pelo menos 15 minutos. Por um momento achei que não conseguiria, mas me lembrei dos ensinamentos do livro e tentei redirecionar toda a frustração que estava sentindo para regiões não sensíveis do corpo. Ainda que não conseguisse eliminar o frio que sentia, o exercício me fez aguentar o período de 15 minutos com mais facilidade.

Parecia que o dia não havia sido inútil, afinal. Poderia ser interessante repetir o treino mais veze no futuro. Saí do lago e vesti minhas roupas. Rezava para que ninguém estivesse por perto e não tivesse me visto completamente nu.

Minha avó me acordou antes mesmo do sol raiar. Ela levava os meus horário muito a sério. Mais até do que eu. Pra ela, era uma vergonha para a família caso eu me atrasasse para a aula na academia, ainda que nosso grupo familiar fosse composto só por nós dois. Me levantei com preguiça e comecei a me arrumar. Quando cheguei na cozinha um farto café-da-manhã me aguardava. Comi um pouco de tudo e terminei de me preparar para a aula. Achava que o dia seria comum, como todos os outros. Encontrei alguns amigos no caminho que me acompanharam até a academia.


- Bom dia, alunos. - Disse o nosso sensei. - Espero que tenham aproveitado o fim de semana para descansar, porque hoje teremos um dia diferente.

- O que quer dizer, sensei? - Perguntou uma garota.

- Quer dizer que hoje teremos um treinamento novo. - Respondeu ele. - Desejo boa sorte a vocês.


O sensei não estava brincando. Ele nos chamou até o lado de fora da academia e nos apresentou a um circuito cheio de obstáculos. Disse que precisávamos nos tornar mais hábeis e resistentes caso quiséssemos nos formarmos na academia e nos tornarmos ninjas. Num primeiro momento, a pista parecia simples. Nenhum de meus colegas mostrou nervosismo. Todos pareciam achar que seria moleza, inclusive eu. Afinal, era apenas uma pista de corrida com alguns enfeites. Na verdade quando o percorremos, tudo foi tranquilo. Nos cansamos, mas conseguimos cumprir os objetivos sem muita dificuldade. Isso até o sensei nos informar que aquela era a primeira de trinta rodadas.


- Esse não é um treino de agilidade. - Explicou ele. - Não estamos aqui tentando observar quem consegue passar pelos obstáculos com mais facilidade ou mais rápido. Queremos colocar vocês ao limite.


Ainda que o cansaço tivesse sido significativo na primeira rodada, a maioria ainda parecia confiante. Eu mesmo acreditava que seria uma tarefa extenuante, mas ainda assim, completamente executável. A segunda rodada mostrou para todos que talvez a maioria de nós não conseguisse completar toda a tarefa. Alguns já saíram no final do circuito completamente ofegantes. Trinta rodadas pareciam um mundo infinito de horas agora. Eu mesmo, um dos alunos que mais se destacava em minha turma em taijutsu e habilidades corporais, sentia que talvez não conseguiria fazer o circuito completo. Ainda que a pista fosse curta, era como se cada obstáculo fosse criado para cansar um grupo muscular específico e a cada volta sentia que meu corpo estava mais próximo da exaustão.

Ainda assim, tentei me manter firme. A maioria dos meus colegas não aguentou até a metade, mas eu e um grupo mais próximo de amigos estávamos determinados a irmos até o fim. Quando chegamos na vigésima rodada eu sentia que meu corpo não aguentaria mais. O sensei e os colegas que ainda estavam conseguindo tentavam me motivar, mas parecia que me faltava força para mover meus músculos. Tentei tirar mais forças de todas as partes, mas não consegui. Contudo, quando o professor sinalizou qual seria a pena dos desistentes, achei uma determinação que nem sabia que tinha. Quem não conseguisse completar a pista, teria que fazê-la novamente no dia seguinte. O corpo dolorido tornaria o circuito impossível de ser completado um dia depois. Por isso, fiz o que achei que seria impossível e completei as 30 voltas. As últimas 5 foram com um ritmo muito desacelerado, já que estava muito cansado. Mas o desafio foi cumprido.