[Treino] Motivações

"Mais um dia..." É o primeiro pensamento que se passa em minha cabeça, todos dias é a mesmice que não resulta em mudança alguma. As vezes me questiono por que não simplesmente desisto, deixo isso tudo de lado e sigo minha vida por outro caminho. Minha mãe estava certa, eu nunca tive aptidão pra essa vida, nem com todo treino possível eu mostrei resultados satisfatórios, continuar me forçando a algo que sou ruim, pra me tornar mediano, enquanto os demais já são muito melhores do que eu desde o ponto de partida, parece tanto uma perda de tempo...

Que seja. Exclamo ao me levantar, meu cabelo bagunçado e roupa amassada terão que esperar, começo o dia da mesma maneira que sempre, após mais um debate lógico que ignoro, estico meu corpo me preparando para o que vem, após esticar bem as pernas e braços, adentro o banheiro e me apronto, com minhas vestes de treino me retiro de casa com apenas um pão em mãos, por sorte ele é ainda novo, não fazem sequer dois dias que foi comprado na promoção, então mastiga-lo é fácil. Meu caminho de sempre, os mesmos rostos no vilarejo vendendo seus produtos, andando para seus trabalhos e começando suas rotinas, faces felizes que me fitam e eu instintivamente respondo com um sorriso falso e um abano de mão vazio. "Quantos deles fingem estar satisfeitos com suas vidas? Quantos almejam por algo diferente cada dia? Quantos realmente são gratos pelo que tem?"

O céu acinzentado não me intimida, se há algo que eu aprendi nos meus primeiros anos de vida é não criar desculpas, se deixar um clima ruim me parar de treinar, logo deixaria uma dor, um dia que estou cansado, uma simples vontade de não ir, até simplesmente parar. "E qual seria o mal de parar? Não é como se você ganhasse algo com isso. Mal faz dinheiro, raramente cumpre as missões, e ninguém continua no ritmo lento igual você pra se manter num time."

É, isto é verdade. Mas se não for isso, faria o quê? Já gastei tanto tempo aqui, amanhã pode ser o dia que tudo me recompensa. — Respondi a meus pensamentos esticando os braços ao céu e estralando o pescoço para o lado, finalmente chegava ao gramado do campo de treinamento, porém meu objetivo era mais a frente, na pista de terra que circulava o lago. Arrastei meu tênis na areia, sentindo aquele solo mais uma vez, enchia os pulmões e espirava todo ar algumas vezes para melhorar meu cardio antes de começar a corrida, passos lentos que logo se tornavam numa corrida ritmada davam início ao treino de mais um dia.

Uma volta completa, só faltavam mais nove das mesmas, e eu sei, pode parecer um tanto repetitivo, mas isso é só um pequeno fragmento do quão repetitivo isso é, depois de fazer a mesma coisa por vários anos, é estranho pensar largar, o que eu faria com meu tempo? Qual caminho seguiria? Duas voltas se completavam, talvez algo com cozinha? Poderia mexer na parte política, seria um bom jeito de ganhar dinheiro, três voltas e ainda sequer tinha ideia de onde começar, o que eu gostava de fazer? No meu tempo livre, geralmente eu treinava, quarto voltas. Música, era uma coisa pouco explorada, mas bem interessante, eu adoraria trabalhar com música, mas isso parece coisa, cinco voltas, de quem precisa de dom. Talvez esse seja meu dom? Nunca tentei, quem sabe. Seis voltas, incrível como antigamente era impossível fazer cinco, e depois de quatro anos eu faço dez como aquecimento, no mínimo eu preciso reconhecer, sete voltas, eu sou um bom saco de pancadas ou carregador de tralhas, tenho resistência o suficiente pra isso, sete voltas, e nada muda, mesmo que meu fôlego suba, mesmo que eu me torna melhor e melhor, eu não consigo chegar no nível dos outros, por quê? Oito voltas, depois nove e dez, todo dia, toda semana, todo mês, por anos, e nada, por quê? Por que só eu não consigo continuar subindo? Nove voltas, e eu continuo atrás de todos, eu sei que sou capaz, sem provas isso é inútil, inútil como essas dez voltas que não mudam nada.

Parei ao terminar as dez voltas, as gotas começaram a cair do céu lentamente, o prelúdio de uma tempestade ou uma simples pancada que se iria? Do que importa, vou continuar aqui, embaixo de chuva, tentando algo que já refiz mil vezes, com a esperança que no próximo dia finalmente mude algo. "O que foi? Você quer que as coisas mudem sozinha, assim do nada?"

Como assim, do nada? Eu não faço nada? Todo dia! Chuva ou sol! O que diabos mais você quer de mim?
"Ué, mas é exatamente como você diz. Você faz, a, mesma, coisa. Todo. Dia. O que diabos vai mudar, repetindo a mesma merda?

Fecho meu punho em frustração, é incrível como eu mesmo tenho um bom ponto contra mim num argumento sozinho, por impulso de raiva soco para frente, acertando uma árvore na minha frente, exatamente por culpa da raiva não controlei direito a minha força e exagerei na pancada, sentindo minha pele arder, provavelmente rasgada pelo impacto perto dos ossos. É fácil falar quando só se precisa ser do contra, por que tu não faz algo então? Decide algo diferente, toma uma rota diferente, arrisca tudo pra talvez descobrir que é péssimo em tudo!

Outro soco, dessa vez a dor que latejava no meu punho direito me fez recuar, ou talvez seja a raiva fazendo a adrenalina em meu corpo se dispersar, mas a dor era diferente, menor. Huh?! Não vai falar mais nada? É claro que não, porra, eu to gritando sozinho igual um louco! Meu punho esquerdo agora atinge a árvore, receio de me ferir de verdade na mão direita? Testar se é a adrenalina? De toda forma, dói.

"O que foi, já desistiu de uma mão? É por isso que nunca acontece nada, teu medo de se machucar te faz ficar preso em um casulo."
E o que caralhos eu teria que fazer? Quebrar minha mão contra um tronco pra provar que isso não é a vida que eu devia tomar? Foda-se então! Coloco toda força por trás do próximo soco, se minha mão não estava sangrando, agora certamente estava, meu punho não só ardia, eu sentia minha mão tremendo, mas sentia ela. Então eu podia continuar, e continuei, com a esquerda, e então a direita, direita, esquerda, tanto faz, quando uma não aguentava mais, a outra tomava lugar, a cada soco a chuva abafava mais o som de meus gritos, geralmente um xingamento por trás de cada soco.

Quando eu mal conseguia fechar meus dedos mais, ergui os punhos e notei o quanto já havia rasgado das mãos, além dos vermelhos intensos que logo se tornariam roxos. Minha respiração pesada, meu corpo encharcado pela chuva, o calor dos movimentos logo se dissipariam e eu provavelmente pegaria um resfriado se continuasse lá. Coloquei as mãos no bolso, não deixando que ninguém notasse o que ocorreu, e sai de lá caminhando com os dentes fechados, cada segundo a dor se intensificava um pouco mais, que merda eu tava pensando? Eu to tentando provar o quê? Agora vou precisar gastar dinheiro comprando bandagens, ou esse machucado ainda vai infecionar.

Após chegar em casa, tomo um banho rápido e me seco, colocando a fita branca enrolada cuidadosamente sobre os punhos, deixo um sorriso bobo escapar, até que fica legal assim.


Treino realizado com finalidade de aumentar o atributo secundário dano físico, sendo um treino duplo (+1000p) com mês em dobro (4PdA lá)
Esse template é temporário por isso tá meio desorganizado
Ficha

Considerações:

— Vamos, acorde! — O grito súbito que me retira do mundo dos sonhos é uma voz conhecida, não é como se fosse surpresa que isso fosse se repetir todo dia por sabe se lá quanto tempo, porém é difícil se habituar a acordar desta maneira sem entrar numa espécie de susto, ainda mais quando se é uma criança. — Vamos garoto, se você é mais fraco que todos, no mínimo precisa se esforçar mais que os demais!

Precisava me recompor rápido, levantar e me aprontar antes que minha mãe se enfurecesse com minha demora, não era uma tarefa fácil, porém acordar a mil por hora ajudava nisso ao menos. Ai sair de meu quarto, ela já me esperava, de braços cruzados com um semblante de inquietação, me aproximava do centro do terreno de areia, envolto pelas casas e abaixava a cabeça, agradecendo-a por me acordar e torturar em treinos insanos todo dia. Não que pudesse falar isso em voz alta.

— O que faremos hoje? Minha pergunta por algum motivo fazia seu rosto se moldar, aquela expressão de raiva já conhecida por mim após todo fim de treino, por algum motivo se emergiu desde o início, fiquei paralisado sem saber se tomaria um golpe no estômago por simplesmente existir ou se ela havia finalmente desistido de mim. — Pirralho, a gente faz a mesma coisa todo dia. E ainda sim, você não parece compreender nada. A única coisa que eu vejo você tendo dom é apanhar, então ao menos eu vou lhe ensinar a apanhar direito.

Continuei perplexo, parado observando-a. O que isso significava? Ela ia me ensinar a apanhar? Bem, isso eu já sabia muito bem, acredito que daquele lugar eu seja o mais apto para ensinar essa matéria, mas minha distração em pensamentos acarretaram no primeiro golpe sofrido sem sequer entender o que ocorria, minha visão simplesmente mudou de encarar ela para o céu, o peso em minhas pernas desapareceram e em troca disso, uma dor nas panturrilhas, perdi o equilíbrio no ar e cai de costas no chão, deixando todo meu fôlego escapar pelos pulmões, o rosto de minha mãe apareceu interditando o sol e me olhando com desaprovação, aquilo sequer era um treino? Ou ela só queria uma desculpa pra descontar a raiva por eu gastar tanto de seu tempo?

Não tinha ideia, contudo ela não parecia motivada de me esperar, e continuou com seus golpes periodicamente, o melhor que eu conseguia fazer ela me defender e recuperar o fôlego para sobreviver ao próximo golpe, em meio a alguns ela dizia algo, como erguer o braço mais, deixar o peso me levar ou não sei o quê, depois de um tempo eu sequer conseguia escutar, o som estava abafado, distante. Minha visão turva, meu corpo pesado, quase que não se mexendo, lento, eu não chegava a sentir dor, mas sabia muito bem que estava sofrendo, era quase como um estado inconsciente, onde eu ainda sabia que estava apanhando.

Quando meu corpo finalmente cedeu, minha consciência foi tomada por uma onda rápida e forte de escuridão, em um instante eu via o punho em direção de meu corpo, e no outro um completo breu. Meus pensamentos voltaram pesados, cansados, mas eu ainda enxergava apenas escuridão, meu corpo dolorido mal respondia, e minha respiração estava difícil e dolorida, consegui por pouco abrir uma fresta de meu olho, enxergando o teto e me situando de estar em uma cama de hospital. Deixei minha mente cair no inconsciente novamente, dormindo por algumas boas horas, e quando acordei o céu estava se despedindo das estrelas, foram o quê? Umas dez, quinze horas de sono, e meu corpo já estava muito melhor. Considerando que eu mal conseguia dormir com aquela rotina pesada, aquele treino foi um dos melhores que eu tive em um bom tempo.


Ficha
Treino flashback (600p) aumentando o atributo secundário Auto-Cura, como é duplo iria passar do teto, não sei se fico com 1PdA pra depois ou ele vai pro limbo?

Considerações: